Opinião

Se não é genocídio, como é que chama?

O ex-presidente Jair Bolsonaro não apenas desmontou e desarticulou todas as instâncias de proteção às etnias indígenas do País como verbalizou por diversas vezes sua intenção de não demarcar um milímetro de terras indígenas. Retirou toda a proteção de órgãos como a Funai, colocando inimigos destes povos nos postos de comando e declarando reiteradas vezes sua ideia de assimilação da cultura branca pelos povos originários, muitas vezes em tom raivoso ou de deboche.

Além disso, e, principalmente, estimulou a ocupação de terras, inclusive terras demarcadas, de diversas etnias, por garimpeiros, madeiros, grileiros e fazendeiros, que, movidos pela cobiça, foram responsáveis por inúmeros assassinatos, estupros, outros atos de violência e destruição ambiental. A cena mais evidente é a da reunião ministerial que manifesta o desejo de “liberar a boiada” em relação ao meio ambiente.

A tragédia Yanomami é a de maior visibilidade. E embora tenha sido amplamente divulgada, o governo de Jair Bolsonaro nada fez para resolver a situação. Pelo contrário, seguiu estimulando a violência contra os povos originários ao retirar as forças de segurança de apoio aos indígenas e deixa-los à mercê de seus algozes (garimpeiros, madeireiros, grileiros, fazendeiros e afins).

Ao mesmo tempo, para forçar a entrada dos destruidores e enfraquecer a resistência indígena, Bolsonaro desmantelou a Funai, Ibama, ministérios, autarquias, serviços de saúde e redes de proteção.

Só no último ano foi registrada a morte de 99 crianças yanomamis. Sem determinar datas, o Ministério dos Povos Indígens informa ainda que ao menos 570 crianças foram mortas pela contaminação por mercúrio, desnutrição e fome. Na conta do governo fascista entram ainda as inúmeras mortes pela covid-19 entre indígenas, a maioria sequer contabilizada, e os assassinatos, como os que ocorreram recentemente na Bahia, os de Dom Bruno, defensores da floresta e seu povo, e centenas de outros, impunemente.

O conceito jurídico de genocídio, seja cometido em tempo de paz ou de guerra, como durante os conflitos nos balcãs ou entre etnias na África, é um crime sob o direito internacional. Tanto a Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, de 1948, quanto o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI), em 1998, têm definição parecida:

“Artigo II – Na presente Convenção, entende-se por ‘genocídio’ qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, tal como:

A) Assassinato de membros do grupo.

B) Dano grave à integridade física ou mental de membros do grupo;

C) Submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial;

D) Medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;

E) Transferência forçada de menores do grupo para outro grupo.

Então, se a atual situação dos Yanomamis não é um genocídio intencionalmente provocado por Jair Bolsonaro, qual outra definição deveria ter?

Talvez assassinato em massa, que é a mesma coisa. E impregna de sangue da mesma forma as digitais deste genocida em fuga.

(*) Fernando Benedito Jr. é editor do DP.

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