quarta-feira, novembro 27, 2024
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Sentimento confuso

(*) Fernando Benedito Jr.

Sou do tipo que passa mal só de ler e ouvir a voz de Jair Bolsonaro. Não suportava seus arroubos no cercadinho, não tolero os ataques à imprensa, nunca vi uma de suas lives porque tenho nojo e tenho alterações de pressão e humor quando vejo coisas como mandar um apoiador que reclamou do preço do arroz ir comprar na Venezuela ou quando assina um decreto prevendo a privatização do SUS. Me faz mal à saúde, aqui, no sentido literal. Tento evitar e recomendo. Infelizmente, a realidade e a profissão não me permitem maior distanciamento.

Acho que o cara é antipático, grosso, ignorante em todos os sentidos, mal educado, cretino, mentiroso, salafrário, violento, machista, chauvinista, homofóbico, para citar alguns dos adjetivos que, penso, lhe caem bem. Mas tem gente que admira, acha legal, bacana, aplaude, considera mito, fenomenal, bonito e até inteligente. Penso, sinceramente, que são pessoas piores do que o mito que cultuam. Ainda que tenham diploma universitário, sejam letradas e cultas, têm algo de errado, possivelmente, sejam psicóticas, problemáticas, possuam algum desvio de caráter, de conduta ou algo que o valha.

O Vargas Lhosa, por exemplo, é um liberal de direita, não concordo com o que pensa, mas respeito. Democraticamente, co-habitaria e dividiria com ele o mundo, lógico, lutando contra as eventuais políticas que ele teria para a economia, para o meio ambiente, etc, mas no terreno da civilidade, com urbanidade e institucionalidade. Com Vargas Lhosa seria possível a convivência. Com esse outro aí, não. É impossível conviver com quem quer nos matar.

Essas considerações me ocorrem a propósito da ideia de que o sujeito deveria ser interditado, cancelado. “Ah, mas a democracia pressupõe a convivência com os diferentes”, “É preciso fazer o debate”, diriam. Mas esse aí é diferente demais, ultrapassa os limites, ele foge ao debate. E, no entanto, onde quer que vá, tem seguidores que o aplaudem, bajulam, bebericam com ele. Adoram o miliciano delinquente como a um Deus, entram em catarse, choram, até. É desses que falo, dessa gente desprezível, tanto quanto ele. Dos que se enroscam na bandeira do Brasil pelo fim da democracia enquanto idolatram as dos EUA e Israel. Pode ser que um dia descubram a verdade e cometam o mesmo desatino com os de esquerda. Não serão menos desprezíveis, seja pelo oportunismo, pela falsidade, pela cretinice ou pela ignorância. É um tipo de gente que muda de lado com facilidade. Lá ou cá, são pessoas do mal, que não fazem bem ao mundo. São aqueles que acham pouco a destruição da Amazônia e do Pantanal, que defendem o SUS sob controle dos planos de saúde, que sustentam a ideia de que armar o povo é a solução para a segurança pública, que vacina é coisa de chinês criador de vírus em cativeiro para dominar o mundo, que a Terra é plana, que Trump é Deus e a esquerda o demônio, que querem assassinar a democracia, fechar o STF, banir o Congresso. Sei de muitos que se arrependeram. Não os perdoo, porque são eles os culpados por isso que está aí. Outros, continuam achando bom. Agora, podem caçar, pescar, desmatar, queimar, matar, espancar, estuprar, que, acham, não serão punidos porque o governo Bolsonaro permite isso. A estes só não desejo o mais profundo dos infernos porque já estão ele.

No mais, sigamos juntos aqueles que querem o outro Brasil. Um País mais inteligente, menos preconceituoso, mais justo, honesto, democrático, com mais empatia e menos antipatia.

A gente que lute!

(*) Fernando Benedito Jr. é editor do DP.

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