Cultura

Essencial é viver!

Artigo debate contexto da apresentação do PL 49, que coloca a educação como serviço essencial com o objetivo de reabrir escolas em plena pandemia

(*) Leonardo Patrick

A partir da segunda quinzena de janeiro instalou-se no município de Ipatinga um tortuoso debate acerca do retorno às aulas presenciais. O governo municipal negligenciou o avanço da pandemia e impôs de forma autoritária o retorno das atividades sem que o devido planejamento fosse elaborado (lembrem-se do plágio do Plano de Retorno às Aulas) – diziam que estavam apenas se preparando para retorno caso as condições sanitárias apontassem para tal. No entanto, dia 22 de fevereiro nos deparamos com o retorno das aulas presenciais mesmo com a ocupação total de leitos de UTI, aumento de casos e internações, ausência de condições estruturais nos prédios das escolas públicas e descumprimento do próprio plano plagiado. Em meio a isso, veio a renúncia do secretário de educação e o surgimento de casos de COVID-19 entre estudantes e profissionais da educação.

Mesmo com a “água batendo no nariz” e os casos, internações e óbitos em constante aumento, o que assistimos neste período foi a total imprudência daqueles que deviam por lei, zelar pela vida da população. Há 15 dias, quando estávamos correndo tanto risco quanto hoje, boa parte dos vereadores da Câmara de Ipatinga e os representantes do governo municipal se aglomeraram no Parque Ipanema para sanção da lei que regulamenta a Política Municipal da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista – diga-se de passagem uma iniciativa louvável e que promove inclusão, mas que ocorreu de forma inadequada.

Não obstante, as medidas agora tomadas pela administração municipal estão atrasadas e são paliativas. Fruto do negacionismo que não conscientizou a população em tempo de se evitar a tragédia que representa uma intubação, procedimento último pra quem sofre da COVID-19. Como Ipatinga não é uma ilha e a política implementada no município está em plena sintonia com o caos que vivemos no país, infelizmente o resultado não poderia ser diferente do que acompanhamos hoje.

Para se evitar tragédia maior, o governo de Minas impôs a onda roxa e com ela medidas restritivas que se aplicam à educação. Porém essa reação tomada agora, não repara os danos causados pela omissão daqueles que dizem defender a educação. Teve gente que por convicção, pressão da opinião pública ou desconhecimento de causa, embarcou nessa irresponsabilidade de dizer que tínhamos condições de retornar com as atividades presenciais nas escolas.

Foram em busca apenas de posicionamentos favoráveis para defesa do retorno presencial, colocando em risco a vida de milhares de pessoas de nossa cidade. Deram as costas para evidências estatísticas, que projetavam o aumento da contaminação a partir da quebra do isolamento social.

É nessa arena de debate que agora tramita um Projeto de Lei para reconhecer a educação como essencial. Reconhecimento que está presente na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Estatuto da Juventude, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nos planos municipais, estaduais e nacional de educação, em tratados internacionais e em tantos outros documentos, leis, resoluções que dispensam ser mencionados aqui.

São tempos difíceis em que há pessoas que acreditam até que a terra é plana. Com certeza, provavelmente devem ter aqueles que não veem a educação como essencial. Basta ver os cortes propostos na PEC Emergencial e em outras medidas econômicas que tomam de assalto recursos do orçamento da educação. No entanto, sabemos em que circunstâncias tal proposta se apresenta.

A pandemia do novo coronavírus trouxe novos termos para o nosso vocabulário, de modo que até aprendemos um pouco sobre leis e as competências dos entes federados. De tanto assistirmos reportagens sobre as medidas sanitárias para conter a COVID-19, sabemos que nas ações mais restritivas fica garantido o funcionamento de atividades consideradas essenciais.

Não é então de se espantar o porquê da elevação das atividades educacionais como algo essencial à nossa vida. Mas o proponente do projeto de lei se “esqueceu de combinar com os russos”.

Estamos na pior fase desde o início da pandemia, com uma desumana sobrecarga de trabalho para os profissionais de saúde. A abertura de leitos já é insuficiente, quando se fala em escassez de recursos materiais e humanos, com possibilidade de faltar insumos para intubação e oxigênio. Isso nos mostra da pior forma possível, o quanto a COVID-19 é um problema de saúde coletiva e está afetando todas as classes sociais. Muitos pacientes, mesmo com recursos financeiros, estão à espera da vaga para um leito de UTI.

Talvez tenha sido essa constatação que faz com que parte daqueles que até outrora eram favoráveis ao retorno das atividades presenciais, se posicionarem contrários ao projeto. Com isso, não bastante as manifestações que reprovam a iniciativa, seu proponente simula uma queda pra cima – ou volta por baixo. Está defendendo a lei como forma permanente de garantir à educação, seu devido reconhecimento.

O que dá reconhecimento da educação como essencial é a forma como o nobre vereador e seus colegas atuarão durante essa legislatura. Fiscalizando os investimentos constitucionalmente garantidos, votando em sintonia com as expectativas dos profissionais da educação, buscando mediar as demandas da comunidade escolar junto às ações desenvolvidas pelo município.

Qualquer ação/iniciativa/proposição dissociada de tal prática é má fé e demagogia. E até agora o que estamos vendo são muitas contradições e uma atuação incoerente. Longe de antecipar resultados por compreender quais interesses estão em disputa na aprovação do PL, espero que o ensejo desse debate sirva de lição para os que “entraram de gaiato no navio”.

A luta sempre foi pela vida, como forma de sobrevivência da economia. Apesar de tentarem dividir essa discussão, não tem como dissociar uma defesa da outra. Porém, quem deve garantir as condições econômicas para defesa da vida é o Estado, o principal indutor da economia.

É o Estado que regula a política de preços, juros, salários e que em momentos de crise como o que estamos enfrentando – a exemplo do que outros países fizeram, deveria ter melhor gerido nossos abundantes recursos para se evitar a priori mortes e, amortecer os impactos econômicos (que são intrínsecos do capitalismo, em que pessoas lucram em detrimento de outras).

Não esperem que a partir da população vacinada, todos restabelecerão suas atividades como antes. É preciso um Estado forte, que garanta direitos e tome medidas para prover as condições necessárias a uma nação que teve seu empobrecimento e suas desigualdades acentuadas durante a pandemia.

É nessa luta que a Educação se apresenta como essencial. Como uma das principais políticas para promoção do desenvolvimento humano, social e econômico.

(*) Leonardo Patrick é graduando em Administração Pública pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro

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