Por Fernando Benedito Jr.
Em sua obra “Segunda Viagem ao Interior do Brasil – Espírito Santo”, o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire, que percorreu o País entre 1816 e 1822, faz um breve esboço de como surgiam as primeiras povoações em Minas Gerais. O olhar atento do estrangeiro vai além das meras questões urbanísticas da época e se aprofunda na alma daqueles que habitam as povoações. É interessante observar como, mais de 200 anos depois, o traço de caráter de um povo ainda permanece intacto. E, no caso, deveria ter mudado.
“(…) Em Minas Gerais, pelo contrário, não existe paroquia sem aldeia e o motivo é facil de se apontar.
Perto do Rio de Janeiro as terras se subdividiram mais do que em qualquer outro ponto do Brasil e quando em dado distrito, há número suficiente de habitantes, forma-se uma parochia.
Como as vendas estão dispersas à margem dos caminhos cada proprietário tem sempre alguma igreja ao alcance. Não havia pois razão para que um grupo de casas se edificasse em torno da capela mais do que em outro logar. Não se dá o mesmo em Minas. Ali, as habitações muito distam umas das outras, e a igreja, onde quer que a colocassem, ficaria sempre muito afastada da maioria dos paroquianos. Além da moradia habitual cada proprietário rural quis ter perto do templo uma casa onde a família pudesse descansar da longa caminhada a que era obrigada para assistir ao serviço divino, receber os amigos ou tratar de negócios no único dia em que se ajuntam os moradores. Os mercadores, taberneiras, operárias, procuraram acercar-se do lugar onde se reuniam os sitiantes e assim nasceu a maioria das aldeias.
É mais ou menos assim tudo o que se empreende neste pais. Os Brasileiros aprendem com facilidade; sabem arquitetar planos, mas entregam-se, demais ao devaneio não medindo obstáculos nem calculando os empreendimentos de acordo com os seus recursos.
Os defeitos da sua administração acumulam os obstáculos fictícios aos reais. O espirito de inveja e intriga mais veemente do que em qualquer
outro lugar, interpõe-se a tudo quanto se faz, tudo perturba, favorece o tratante, e desencoraja o homem honesto. Começa-se qualquer empreendimento útil, para logo ser interrompido e abandonado. Às vezes um serviço ordenado pelo governo e que se poderia acabar em pouco tempo, e com despesas minímas, jamais termina, embora nele se trabalhe sempre. Esta obra como que quasi se torna o apanágio de um homem de posição. De que viveria ele se lhe tomassem tal patrimônio?”