(*) Mauro Falcão
Vivemos imersos em uma era de velocidade, onde a ocupação constante virou sinônimo de valor. Estar sempre atarefado passou a ser confundido com estar vivo, útil, produtivo. No entanto, esse ritmo vertiginoso esconde uma tragédia silenciosa: a perda da presença. Estamos cada vez mais ocupados — e cada vez menos presentes.
A ocupação constante tem um custo alto: ela rouba de nós o tempo da reflexão. Mergulhados em tarefas e prazos, deixamos de nos perguntar por quê e para quê. O automatismo toma o lugar da consciência. Repetimos ações, seguimos rotinas, cumprimos metas — mas esquecemos de viver com sentido. Tornamo-nos peças de um sistema que premia a produtividade, mas ignora a alma.
Nesse cenário, criamos uma zona de conforto que, longe de nos proteger, nos limita. Fugimos dos desafios que exigem esforço interior. Evitamos as pausas que poderiam nos colocar diante das nossas angústias, nossos desejos mais profundos, nossos conflitos esquecidos. Ao anestesiar a consciência, perdemos o contato com a nossa própria humanidade.
E o mais grave: as experiências que deixamos de viver hoje podem fazer falta amanhã. O que não sentimos, o que não enfrentamos, o que deixamos para depois… tudo isso pode se transformar em ausência. Uma ausência que nos acompanha silenciosamente, cobrando o preço do que não ousamos experimentar.
Viver é mais do que cumprir tarefas. É preciso parar. Refletir. Habitar o próprio tempo com presença e verdade. Silenciar os ruídos externos para ouvir a voz interior que clama por sentido.
A tragédia do tempo sem alma não está apenas na correria — mas no esquecimento de si. É possível estar em todos os lugares e, ainda assim, não estar em lugar nenhum. O resgate começa com uma escolha: desacelerar para reencontrar o que realmente importa. Porque só a presença desperta é capaz de dar alma ao tempo.
(*) Mauro Falcão é escritor brasileiro