Durante pronunciamento oficial, presidente disse que Moro pediu cargo no STF em troca da demissão na Polícia Federal
BRASÍLIA – O presidente Jair Bolsonaro fez um pronunciamento ressentido sobre a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça, anunciada nesta sexta-feira (24). Junto a integrantes do seu corpo ministerial, Bolsonaro afirmou que Moro tem “compromisso com o seu ego, e não com o povo brasileiro”.
“Sabia que não seria fácil. Uma coisa é você admirar uma pessoa, outra é conviver com ela, trabalhar com ela”, afirmou Bolsonaro.
O presidente rebateu acusações de que tenha dificultado operações de combate à corrupção na Polícia Federal. O ex-capitão afirmou que seu governo “botou um ponto final” em esquemas de corrupção em empresas estatais e deu créditos a Moro quando ele levou apenas profissionais de Curitiba à sua equipe no Ministério da Justiça.
“Lógico, me surpreendeu. Será que os melhores quadros da Polícia Federal, todos estavam em Curitiba? Mas vamos confiar. Vamos dar um crédito. E assim nós começamos a trabalhar”, disse Bolsonaro.
Bolsonaro declarou que não fez interferência política no trabalho da Polícia Federal, mas reclamou de falta de esforços para investigar a tentativa de assassinato que sofreu durante a campanha eleitoral de 2018, com uma facada. Na opinião do presidente, houve maior apoio para as investigações sobre a execução da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ).
“É intervenção pedir a Sergio Moro, quase implorar, que apure quem mandou matar Jair Bolsonaro?” disse. “A PF de Sergio Moro se preocupou mais com quem matou Marielle do que com quem tentou matar seu chefe supremo.”
MORO QUERIA STF
Bolsonaro afirmou que o ex-ministro da Justiça pediu a indicação do Palácio do Planalto para seu ingresso como magistrado do Supremo Tribunal Federal (STF), em troca da demissão de Maurício Valeixo da direção-geral da Polícia Federal.
“Já que ele falou em algumas particularidades, mais de uma vez, o senhor Sergio Moro disse para mim: ‘Você pode trocar o Valeixo sim. Mas em novembro. Depois que o senhor me indicar para o Supremo Tribunal Federal”, disse Bolsonaro. “Me desculpe, mas não é por aí. Reconheço as suas qualidades. Chegando lá, pode fazer um bom trabalho. Mas eu não troco. E outra coisa: é desmoralizante para um presidente ouvir isso.”
O presidente reivindicou o direito de trocar o ocupante da direção-geral da Polícia Federal, porque, por lei, está autorizado a tomar essa decisão sem “pedir autorização para ninguém”. Valeixo foi exonerado na manhã desta sexta-feira 24.
Bolsonaro atribuiu as críticas que recebeu a um levante de “poderosos” contra a sua luta “contra o sistema”.
“Poderosos se levantaram contra mim. E é uma realidade. Eu estou lutando contra um sistema, contra o establishment”, afirmou. “Sergio Moro, o senhor disse que tinha uma biografia a zelar. Eu digo a vossa senhoria: eu tenho um Brasil a zelar.”
Bolsonaro rejeitou ainda a suposição de que teria mudado a direção da PF por interesses em proteger os seus filhos de apurações criminais. O presidente falou que não quer “blindar a sua família” e que “nunca faria isso”. Segundo Bolsonaro, Moro não o quer na cadeira presidencial e afirmou que os dois pensam de forma “bastante diferente”.
Ao longo do pronunciamento, Bolsonaro lembrou ainda que ficou decepcionado quando encontrou Moro pela primeira vez, em 2017, num aeroporto.
“Ele praticamente me ignorou. A imprensa toda noticiou isso dando descrédito à minha pessoa. Confesso que fiquei triste, ele era um ídolo para mim. Eu era apenas um deputado”, recordou.
Bolsonaro estava acompanhado do vice-presidente Hamilton Mourão e de ministros como Nelson Teich (Saúde), Paulo Guedes (Economia), Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores). Também estavam presentes os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Carla Zambelli (PSL-SP) e Hélio Lopes (PSL-RJ).
As acusações de Moro sobre interferência política na Polícia Federal alimentaram as hipóteses de crime de responsabilidade por parte de Bolsonaro, chave para um processo de impeachment.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, viu “indícios de crimes apontados por Moro” contra Bolsonaro e afirmou e a entidade vai analisar o caso.