(*) Nina Cordeiro
Recentemente foi publicado na mídia o descontentamento da Sra. Elaine Soares Bastos Mendes, companheira do vocalista da banda Roupa Nova, falecido no final de 2020 por complicações da Covid-19, que alegou ter convivido em união estável por 16 anos com Paulinho e foi surpreendida com o fato dos dois filhos de Paulinho não terem sequer mencionado o seu nome no inventário de seu companheiro.
Embora o caso seja midiático, situações como a da Sra. Elaine são muito comuns na rotina do Judiciário.
Segundo dados do IBGE, no Brasil o número de uniões estáveis já supera a marca de 36,4% do total dos tipos de relacionamentos.
Por uma desinformação ou mesmo por uma cultura da informalidade enraizada e vivenciada pelo brasileiro, não é difícil se deparar com situações iguais a da Sra. Elaine.
Aos que acreditam que união estável é igual ao casamento, vai um alerta: não é!
O fato da legislação reconhecer que a união estável é uma entidade familiar e não permitir que haja tratamento discriminatório em relação ao casamento, não quer dizer que a união estável seja igual ao casamento.
No ano de 2017, por ocasião do julgamento RE 878694, com repercussão geral reconhecida, o STF entendeu que o companheiro deve ser equiparado ao cônjuge para fins sucessórios, em respeito aos princípios da dignidade da pessoa humana e da liberdade de constituir família.
Com isso, entende-se que a pessoa que vive em união estável, tem os mesmos direitos à herança, se comparado aos casais constituídos através do casamento.
O problema central está na dificuldade encontrada pelos companheiros quando essa união estável é questionada, seja pelos herdeiros do companheiro falecido ou até mesmo pelo INSS quando o companheiro sobrevivente precisa comprovar a referida união para receber o benefício previdenciário da pensão por morte.
A título de exemplo, se a companheira de Paulinho fosse casada, obrigatoriamente o seu estado civil teria que constar na sua certidão de óbito e não seria possível aos filhos darem entrada no inventário sem incluir a esposa. Porém, como ela não se casou, se os herdeiros continuarem a não concordar com a existência da referida união, ela precisará comprovar o óbvio, por meio de uma ação declaratória de união estável paralelamente ao processo de inventário.
Como é sobejamente sabido, uma ação judicial litigiosa em regra demora anos para se encerrar, o que faz com que os bens não possam ser partilhados e por muitas vezes sequer usufruídos por quem é de direito.
Portanto, é muito importante que o relacionamento do casal, quando for público, contínuo, duradouro e com o objetivo de ser família, seja no mínimo formalizado com uma escritura pública declaratória de união estável que pode ser facilmente lavrada em cartório e que nela já conste qual o regime de bens vai reger aquela união.
De qualquer forma, ainda assim é importante alertar que a escritura pública de união estável é um forte indício da existência daquela união, mas ainda não surte os mesmos efeitos do casamento, pois como qualquer outra ela pode ser discutida judicialmente e não altera o estado civil do casal. Por isso, se querem um conselho, casem-se, mas se não querem casar-se, ao menos façam a referida escritura e optem de forma consciente pelo regime de bens que melhor se adequa ao casal.
É muito importante a conscientização nesse sentido, pois inevitavelmente um dia qualquer união terminará, seja pela separação, seja pela morte. Ambas as situações causam angústia, tristezas e atribulações. Sendo assim, ao formalizar a união, o casal pode evitar que esses sentimentos sejam potencializados com ações judiciais.
Formalizar a união também é um ato de amor!
(*) Nina Cordeiro é advogada especialista em Direito de Família e Sucessões, presidente da Comissão de Direito Sucessório do IBDFAM Núcleo Vale do Aço e presidente da Comissão de Direito de Família da OAB de Ipatinga/MG.