Com “facilidades” para elaborar revisão do Plano Diretor, FIA cobra mais caro; valor saltou de R$ 767.812,00 no governo anterior para R$ R$ 1.910.400,00 no atual
IPATINGA – O contrato de mais de R$ 4,4 milhões entre a Prefeitura de Ipatinga e a Fundação Instituto de Administração (FIA), que está sendo questionado em representação feita pelo Instituto Cidade ao promotor Humberto Henrique Rufino de Miranda, da 10ª Promotoria Estadual, em Ipatinga, além dos altos preços e “vícios” apontados na condução do processo de revisão do Plano Direto de Ipatinga, destaca ainda uma série de fragilidades para justificar a dispensa de licitação. A FIA foi contratada sem licitação pelo valor global de R$ 4.482.202,80 milhões. O contrato prevê a prestação dos serviços de revisão do Plano do Plano Diretor (R$ 1.910.400,00), estudos para proposta da reforma e modernização administrativa (R$ 1.721.452,80) e da reforma do Código Tributário Municipal (R$ 850.350,00).
Um dos pontos mais intrigantes da contratação é o fato do Termo de Referência, um conjunto de exigências técnicas para fundamentar a contratação, elaborado para a licitação 020/2020, ter sido substituído por outro termo, de menos de uma página, e sem as exigências e qualificações do processo anterior. Uma flagrante facilitação para a FIA.
Para consolidar a contratação da FIA sem licitação, a Prefeitura de Ipatinga suspendeu um certame que estava em andamento e do qual participavam 8 empresas, o que significa que as concorrentes concordavam com o preço máximo proposto pela Prefeitura que era um valor global de R$ 2.644.197,00 para a revisão do Plano Diretor (R$ 767.812,00) e do Plano de Mobilidade Urbana (R$ 1.876.385,00). A primeira fase, de qualificação técnica das empresas, já havia ocorrido e faltava a abertura dos envelopes de preços.
Para suspender o processo uma das alegações foi que a revisão do Plano Diretor e o Plano de Mobilidade, embora temas tecnicamente afins, deveriam ser licitados separadamente. Entretanto, na contratação sem licitação, a Prefeitura reuniu num mesmo “pacote” três temas totalmente dissociados um do outro, quais sejam: Plano Diretor, Código Tributário e Reforma administrativa.
AUTO ELOGIO
Segundo a representação, no Contrato assinado com a FIA em 18 de outubro de 2021 parte considerável do conteúdo é dedicado à “justificativa” da contratação sem licitação daquela entidade.
Segundo o texto, a FIA é uma “entidade sem fins lucrativos” que se encaixaria no rol de instituições dispensadas de licitação pelo Art.24 da Lei 8.666/93. Em seguida, outra parte considerável do Contrato é dedicado a louvas aos trabalhos anteriores e à capacidade acadêmica da FIA.
PREÇO DE MERCADO
“Um ponto interessante – sublinha a representação ao MP –, é que na pag. 09 é citada a Súmula 250 do TCU na qual, mesmo para casos de dispensa, firmou a posição de que a contratação deve-se mostrar razoável, com preços compatíveis com o mercado”, anota a representação do Instituto Cidades.
Diz ainda a notícia-de-fato que para mostrar que o preço da FIA “atende ao referido requisito” são citados orçamentos oriundos das entidades Fundação para Pesquisa e Desenvolvimento da Administração, Contabilidade e Economia (FUNDACE) e Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), “de reputação similar”, cujas cotações teriam sido R$ 5.772.000,00 e R$ 5.252.880,00. Neste caso, o valor de contratação da FIA teria sido 14,7% inferior.
DÚVIDAS
A respeito destas cotações, a representação ao MP tece as seguintes considerações:
● Não se sabe exatamente o que foi pedido para a FUNDACE e para a FIPE cotar.
● Não se sabe exatamente quanto a FUNDACE e a FIPE pediram para a execução do Plano Diretor, portanto, não se sabe se a contratação deste trabalho foi vantajosa.
● Certamente, o “preço compatível com o mercado” exigido pelo TCU está mais para o preço de R$ 767.812,00, que motivou oito (8) empresas a se apresentarem para o certame, do que para o preço de quase dois milhões que a FIA praticou. O primeiro, sim, é o valor de mercado!
● Não há justificativa que se sustente em se contratar uma entidade, apenas porque se apresenta como SEM FINS LUCRATIVOS, por um preço que é o TRIPLO do valor daquele que empresas mesmo COM FINS LUCRATIVOS se propõem a fazer.
QUALIDADE DOS SERVIÇOS
Outra ponderação do Instituto diz desrespeito à qualidade dos serviços prestados: “Não bastasse a brutal diferença de preço entre a concorrência aberta em 2020 e a contratação da FIA em 2021, há também diversos comentários a fazer sobre as diferenças entre os escopos e a qualidade do serviço”.
Para fundamentar suas afirmações sobre a qualidade dos serviços prestados, o Instituto Cidade utiliza o Termo de Referência da licitação, que estabelece todas as atividades, todos os produtos, a metodologia, as equipes, cronograma e outros procedimentos que serão adotados na Revisão do Plano Diretor. O Termo de Referência deve conter os elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar o objeto da licitação e deve a ela ser anexado.
“O Termo de Referência da licitação 020/2020 tinha cerca de 50 páginas de descritivo de atividades, e foi inteiramente produzido pela equipe técnica da Secretaria de Planejamento. Já o que seria o Termo de Referência da FIA, contendo a descrição das atividades não chega a ocupar 1 (uma) página”.
MAPAS TEMÁTICOS
Talvez dando como favas contadas a dispensa de licitação, uma vez que o processo licitatório já havia sido suspenso, o governo mandou às cucuias o Termo de Referência, tanto que o documento da licitação 020/2020 continha a exigência de revisão e execução de todos os mapas temáticos que compõem os Anexos do Plano Diretor. “Mas nada disto contava como obrigação para a FIA, e todo o serviço de atualização e de compatibilização de mapas foi feito realizado pelos técnicos da PMI”, afirma o Instituto Cidades na representação ao MP.
QUALIFICAÇÃO TÉCNICA
O Termo de Referência da licitação 020/2020 descrevia ainda as qualificações técnicas necessárias de pelo menos 10 (dez) dos integrantes da equipe da empresa que quisesse participar da licitação. “No ‘Termo’ da FIA nenhuma referência sobre qualificação técnica de integrantes da equipe foi feita”, garante a representação.
ANÁLISE TÉCNICA E JURÍDICA
O Termo de Referência da licitação 020/2020 previa uma ampla Análise técnica e jurídica do Plano Diretor vigente, já na primeira fase dos trabalhos. Portanto, à luz desta Análise, obrigatoriamente, a equipe passaria pelo TAC firmado com o Ministério Público para as devidas adequações de suas diretrizes e consequente revisão da Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo. Como nada disso constava para a FIA, eles só tomaram conhecimento do TAC depois da Minuta pronta.
Diante de tal situação, a representação do Cidades, indaga: “Como possivelmente uma contratação com tantas exigências A MENOS poderia custar o TRIPLO?”
INTERAÇÃO
Outra exigência do Termo de Referência da Licitação 020/2020 que é negligenciada pela FIA é sobre interação permanente com a equipe técnica da Secretaria de Planejamento. Já no “Termo” da FIA nada consta sobre isto. Em um outro documento produzido pela FIA, que se intitula “PLANO DE TRABALHO”, que pretende ser um detalhamento das atividades constantes do “Termo” da FIA, a expressão “o diálogo e interlocução com a equipe local de servidores” aparece em seis (6) “sub-ações”. Entretanto, não foi isto o que se viu.
Segundo o Instituto Cidade, “no ano passado houve apenas uma tentativa de reunião da equipe técnica da Secretaria de Planejamento com a FIA. Este ano apenas uma técnica participou de quatro reuniões. O restante da equipe não foi chamado para reuniões e nem para participação nas Oficinas e Audiências Públicas nas Regionais”.
Diz a representação:
● Nenhuma das observações passadas pela equipe técnica para a FIA foi considerada na Minuta apresentada. Diversos documentos preparados pela equipe técnica foram ignorados.
● Nenhum estudo foi feito que permitisse ou justificasse nenhuma das diversas propostas novas trazidas para o Plano Diretor (ex. Zona de Reestruturação, ou Outorga Onerosa).
● Nenhuma das anotações, ofícios, manifestações e pedidos protocolados pela população durantes as Oficinas e Audiências nas Regionais chegou até a equipe técnica da Secretaria de Planejamento.
E conclui: “Enfim, esta é a qualidade do serviço contratado sem licitação junto a FIA, pelo TRIPLO do preço, e, portanto, qualidade também não
pode ser alegada como justificativa para a sua contratação por dispensa para a Revisão do Plano Diretor”.