Parlamentares rejeitaram mudanças feitas na Câmara em dispositivos da Lei da Mata Atlântica; especialistas alertavam para afrouxamento nas regras de proteção do bioma
BRASÍLIA – O Senado excluiu trechos de uma medida provisória que enfraqueciam regras de proteção da Mata Atlântica. Segundo especialistas, os dispositivos, na prática, facilitariam o desmatamento do bioma. O texto volta para análise da Câmara.
Editada pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) e ainda em vigor, a primeira versão da MP prevê a prorrogação do prazo de adesão dos imóveis rurais ao Programa de Regularização Ambiental (PRA).
JABUTIS
O texto, porém, chegou ao Senado com modificações feitas pela Câmara dos Deputados em março. Foram incluídas alterações na Lei da Mata Atlântica, classificadas como “jabutis” — trechos que não têm relação com o tema principal da proposta.
Entre os pontos modificados estão o fim da exigência de compensação em caso de desmatamento de vegetação fora das áreas de preservação permanente e a flexibilização do desmatamento de vegetação primária (original) e secundária em estágio avançado de regeneração.
Com a exclusão dos trechos, o Senado mantém as atuais regras de proteção previstas na legislação do bioma.
REJEIÇÃO DAS MUDANÇAS
Os senadores rejeitaram as mudanças feitas pelos deputados e aprovaram uma impugnação dos trechos. Isso impede a retomada dos trechos sobre Mata Atlântica durante a nova votação na Câmara.
Artigos de um projeto são impugnados quando declarados inconstitucionais ou se não possuírem relação com o tema da proposta.
Pelo regimento do Congresso, uma vez impugnado, o trecho não poderá ser restituído pelos parlamentares. No entanto, há precedentes em que os deputados discordaram dos senadores e retomaram artigos que foram retirados em votações.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), alertou aos colegas da possibilidade de judicialização do caso diante do imbróglio. Ele afirmou que não gostaria de criar um “ambiente de desconfiança entre as duas Casas”.
O relator da proposta, Efraim Filho (União-PB), já havia excluído o trecho no parecer, mas sem usar a estratégia de impugnação.
Autora de um dos pedidos de remoção do trecho que afrouxava as regras de combate ao desmatamento na Mata Atlântica, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) insistiu pela derrubada do artigo. De acordo com ela, os deputados poderiam “ressuscitar” as medidas.
O líder do PSD, Otto Alencar (BA), e o senador Omar Aziz (PSD-AM) também protestaram. Os dois argumentaram que obras como de gasodutos poderiam ser feitas em áreas da floresta hoje intocadas.
“Uma vergonha o Senado se curvar a esse tipo de coisa. É lógico que [os deputados] vão modificar, vão trabalhar para voltar o jabuti de novo. Não dá pra confiar. Quem fez isso aqui não fez de boa-fé. Isso é pra defender interesse pessoal de empresário”, disse Aziz.
Após pressão dos senadores, Pacheco e o relator concordaram em votar a impugnação, que foi aprovada e, com isso, os trechos sobre Mata Atlântica saíram da MP.
DESMATAMENTO
Dados da Fundação SOS Mata Atlântica mostram que entre agosto e outubro do ano passado, foi registrado o desmatamento de mais de 6.850 hectares – o equivalente a devastar, nesse período, 75 campos de futebol todos os dias.
Segundo a fundação, somente 12,4% do bioma possui vegetação original.