Decisão do ministro Kássio Nunes Marques em plena pandemia soa como agradecimento ao Planalto, segue diretriz de Bolsonaro e irrita pares da Suprema Corte
DA REDAÇÃO – A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federa(STF) Kássio Nunes Marques de autorizar a abertura de templos religiosos durante pandemia causou surpresa entre seus pares e, principalmente, divergência com a decisão. Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga aberta coma saída do ministro Celso de Melo, Nunes Marques parece estar cumprindo determinações do Planalto ao manifestar seus votos. Nos temas mais polêmicos, ele sempre vota alinhado com as diretrizes políticas e ideológicas do Palácio do Planalto – antes como um agradecimento e uma retribuição do que fundamentado em preceitos constitucionais ou jurisprudências consolidadas pela Corte. Além da abertura dos templos religiosos, Kássio Nunes Marques também foi contra a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro no caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
CONFLITANTE
Contrário às posições de Nunes Marques, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes rejeitou na segunda-feira (5) a concessão de uma liminar (decisão provisória) para suspender o decreto do governo de São Paulo que proíbe celebrações religiosas no estado diante do aumento expressivo dos casos e mortes pela Covid-19. O ministro enviou o caso ao plenário da Corte.
A decisão contraria o entendimento do ministro do STF Nunes Marques, que determinou neste sábado (3), em caráter liminar, que governadores e prefeitos não podem proibir a celebração de atos religiosos desde que preservados protocolos sanitários, entre eles, lotação máxima de 25% da capacidade do local.
Com as decisões conflitantes, caberá ao plenário do Supremo dar a palavra final sobre a liberação, ou não, dos cultos e missas. O presidente do STF, ministro Luiz Fux, marcou o julgamento para esta quarta-feira (7).
COLAPSO
A decisão de Gilmar Mendes foi proferida em uma ação do PSD em que o partido questiona o decreto do governo de São Paulo, que instituiu medidas emergenciais destinadas ao enfrentamento da pandemia, entre elas, a proibição de cultos, missas e outras atividades religiosas com presença de público no estado.
Em sua decisão, Mendes afirmou que estados e municípios podem fixar medidas restritivas para o enfrentamento da pandemia, inclusive, o fechamento de templos e igrejas. Para o ministro, restringir cultos não atinge a liberdade religiosa, uma vez que não interfere nas liturgias.
“A restrição temporária de frequentar eventos religiosos públicos traduz ou promove, dissimuladamente, alguma religião? A interdição de templos e edifícios equiparados acarreta coercitiva conversão dos indivíduos para esta ou aquela visão religiosa? Certamente que não”, afirmou.
O ministro disse ainda que, além da escalada do número de mortes, São Paulo vive um verdadeiro colapso no sistema de saúde.
“Em um cenário tão devastador, é patente reconhecer que as medidas de restrição à realização de cultos coletivos, por mais duras que sejam, são não apenas adequadas, mas necessárias ao objetivo maior de realização da proteção da vida e do sistema de saúde”, afirmou.
“RELIGIOSO”
Já o ministro Marco Aurélio foi um pouco mais ácido nas críticas. disse neste domingo (4.abr.2021) que vê com “muita preocupação” a liberação de cultos e missas presenciais no país, em meio à pandemia. Em entrevista ao Poder360, afirmou que não cabe ao Judiciário a decisão de “abrir ou fechar”. “Nós não sabemos as consequências”, declarou Marco Aurélio. “Essas medidas que ele [Nunes Marques] introduziu, são uma vitrine. A realidade é outra. Não sabia que ele era tão religioso”.
PLACAR DE 10 A 1
No sábado, véspera da celebração da Páscoa, o ministro Nunes Marques autorizou, em decisão monocrática, a realização de cultos e missas.
Marco Aurélio criticou a decisão do colega. Disse que a liberação de cultos e missas poderá ser discutida na sessão do plenário do STF na 4ª feira, e que será derrubada pelos ministros da corte.
“Prevejo um quorum de 10 a 1. Eu cansei de ficar isolado, agora é a vez de outro”, afirmou.
No despacho, Nunes Marques determinou que as celebrações religiosas devem seguir protocolos sanitários de prevenção à covid-19, como limitação de público em até 25% da capacidade dos templos, o distanciamento social entre os fiéis e a obrigatoriedade do uso de máscaras.
EXECUTIVO
“O Judiciário chamou para si uma responsabilidade que não é dele”, declarou.
O despacho de Nunes Marques foi dado em um processo aberto pela Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos). Para Marco Aurélio, o magistrado implementou a liminar “substituindo-se ao Executivo”.
“Isso não é bom. Cada Poder deve atuar em sua área, e o Judiciário só pode atuar depois que surge um conflito de interesses”, declarou.