Cultura

Mysterium Cosmographicum

Os terraplanistas e os bolsonaristas estão errados, definitivamente, a Terra é redonda

Fernando Benedito Jr.

“Mysterium Cosmographicum” é o título de uma das grandes obras do astrônomo, astrólogo e matemático alemão Johannes Kepler. Nela, Kepler pensou que havia revelado o plano geométrico de Deus para o Universo. Mas não, quem está revelando o plano de Deus são os terraplanistas, um plano B e equivocado, estúpido, mas há quem acredite e é preciso por um fim nisso. Kepler era um cara sério, assim como foram sérios e estudiosos outros que vieram antes e depois dele como Aristóteles, Erastótenes, Nicolau Copérnico, Isaac Newton, Galileu Galilei, Albert Einstein e todos que correram o sério risco de serem queimados nas fogueiras da Santa Inquisição ou dos campos de concentração. Este último risco foi menor para cientistas como Von Braun, aliado dos nazistas, e um dos primeiros a mostrar que a terra era redonda, colocando em órbita os foguetes V-8. Estes cientistas não são como os cretinos dos terraplanistas que não se baseiam em nada para formularem as teorias de conspiração que imperam nestes tempos obscuros das redes sociais. É normal questionar as verdades únicas, o que não é normal é contrariar a Ciência e suas provas irrefutáveis, consolidadas em milhares de anos, através dos séculos, por observações, pesquisas, viagens interplanetárias e instrumentos ópticos, em nome de absurdas teorias conspiratórias.

Em 240 a.C., Erastótenes comparou as sombras de Assuan no Egito com as de Alexandria, ao norte. Ao meio dia em Assuan não havia sombra; em Alexandria, um graveto que ele fincou no chão deu sombra no mesmo horário e Erastótenes percebeu que se soubesse o ângulo da sombra e a distância entre as duas cidades ele poderia calcular a circunferência do globo. Usou a inteligência só um pouquinho mais do que a maioria dos terraplanistas e seus séquitos de preguiçosos mentais que preferem acreditar em teorias reptilianas e conspiratórias do que fazer qualquer investigação minimamente científica, para não correrem o risco de verem suas “profecias” estúpidas caírem por terra como um castelo de areia.

Perdi algum tempo assistindo ao documentário “A Terra é Plana” (2018, 1h35min, EUA), de Daniel J. Clark, em cartaz na plataforma Netflix. Num primeiro momento achei que era brincadeira dos tais teóricos da terra plana, em busca de notoriedade nestes tempos de sucesso fácil. Depois continuei achando mesma coisa, com o agravante de que era uma grande imbecilidade, suspeita que se confirmou quando constatei que o documentário não oferecia nada de interessante além da afirmação de que a terra é plana porque é plana. E o mais absurdo e incrível disso tudo é que os terraplanistas conseguem adeptos (Olavo de Carvalho, guru de Bolsonaro é um deles) mesmo depois das viagens de circunavegação, da Nasa ter enviado foguetes à lua, telescópios e robôs ao espaço, do planeta ter sido fotografado de todos os ângulos possíveis, das imagens de inúmeros eclipses solares que mostram a curvatura da terra e de todas as possibilidades de se constatar que a terra é redonda até mesmo a olho nu.

Para quem duvida, fica uma sugestão de vídeo:

Tirando o aspecto humorístico das teorias conspiratórias, entre as quais a de que a Terra é plana, não sobra muito para refutar sobre o lado escuro da mente dos lunáticos (coitada a Lua) que acreditam tão piamente em sua própria ignorância. Muito mais do que um problema de astronomia, trata-se de uma insanidade para ser resolvida pela psiquiatria e pela psicanálise. E é grave, porque para afirmar que a Terra é plana, os terraplanistas negam não só a história da Ciência e sua evolução, como se apóiam em bolsonaristas, olavistas, trumpistas, defensores da Escola sem Partido, da reforma da Previdência, da liberação de armas, dos cortes de verbas das universidades federais e pesquisas (porque ficará mais difícil para os comunistas defenderem que a Terra é redonda) e nos milicianos (que irão defendê-los dos reptilianos) para sustentarem suas não-teorias.

O medo maior é quando descobrirem Darwin e resolverem contestar a teoria da evolução das espécies. Aí vai danar tudo.

(*) Fernando Bendito Jr. é editor do Diário Popular.

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