(*) Mauro Falcão
Não quero que minhas palavras sejam entendidas como um ataque à ciência ou às universidades. Pelo contrário, foram nelas que encontrei parte essencial da minha formação e trajetória. O que desejo é provocar uma reflexão sincera: nossas mentes são condicionadas por um sistema tão sutil que raramente percebemos. Muitas vezes aceitamos essa condição porque ela nos dá segurança. É como uma prisão invisível que, em vez de nos oprimir, nos embala com conforto.
Passei mais de quatro décadas entre livros, provas, teorias e diplomas. Esse caminho ampliou meu olhar, sem dúvida. Mas também revelou algo inquietante: fomos treinados para sermos profissionais, para ganhar dinheiro, para vencer competições. Isso tem seu valor, mas não é tudo. Fomos pouco preparados para compreender a vida, lidar com dilemas humanos, espirituais ou emocionais, buscar felicidade e realização.
Minha mente, como tantas outras, foi moldada para se mover dentro de fronteiras invisíveis. Para reproduzir conhecimentos selecionados, recortados e moldados de acordo com finalidades específicas. Enquanto alguns saberes eram valorizados como legítimos, outros eram descartados como inúteis ou perigosos. Percebi que esse processo não era apenas ensino — era condicionamento.
E ao que fomos condicionados? À lógica do capital. A engrenagem que sustenta a maioria das instituições, mesmo quando não se admite, é a preparação de profissionais para gerar lucro. O conhecimento passa a ser filtrado como mercadoria. Ensina-se o que serve à competitividade, ao desempenho econômico, à inserção no mercado. O restante se perde pelo caminho. Assim, formamos mentes adaptadas ao sistema, mas não necessariamente livres.
Nesse processo, compreendi o peso de suas consequências. Cedo ou tarde nos deparamos com limites que o saber utilitário não resolve: questões da vida ou mesmo científicas que exigem justamente aquilo que foi desprezado. É nesse instante que a ilusão se desfaz e a máscara cai — percebemos que fomos preparados para competir, mas não para compreender; para vencer, mas não necessariamente para viver.
A velha conveniência persiste: se a crença cabe nos protocolos acadêmicos, é aceita; se os ultrapassa, é desprezada. O “placebo” é legitimado porque interessa à medicina, mas a “fé” é rejeitada porque ameaça a exclusividade da ciência. Assim, os mesmos fenômenos são julgados por critérios distintos.
Só mais tarde percebi que havia sido treinado não apenas para aprender, mas para obedecer. E, mais grave ainda, que esse processo não se limitava a mim: todo o sistema pedagógico é atingido e retroalimentado, formando condicionados e condicionadores em um círculo infindável, que perpetua a lógica do sistema sob a aparência de neutralidade acadêmica.
O mundo não precisa apenas de especialistas, mas de consciências livres. De diplomas, mas também de sabedoria. De produção econômica, mas sobretudo de realização humana. Hoje me pergunto: quero ser apenas produto desse condicionamento, repetidor de fórmulas úteis ao sistema? Ou ousar ser um ser humano inteiro, capaz de buscar a verdade além dos muros institucionais?
Essa frase bíblica é a síntese de tudo o que aprendi:
“De que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Marcos 8:36).
(*) Mauro Falcão é pesquisador e escritor brasileiro
E-mail: advfalcao@hotmail.com