68% das vítimas de feminicídio são mulheres negras. O Brasil ocupa o primeiro lugar em número absoluto de feminicídios na América Latina e no Caribe.
RIO – Uma década após a implementação da Lei do Feminicídio, uma onda de assassinatos motivados por gênero assusta a população feminina do país. Casos de feminicídio têm inundado o noticiário, com relatos de violência brutal em que homens têm dado fim à vida de mulheres.
Segundo a pesquisa “Quem são as Mulheres que o Brasil não protege”, da Fundação Friedrich Ebert no Brasil, divulgada em novembro, o registro de mortes de mulheres em razão do gênero cresceu 176% em 10 anos, passando de 527 casos, em 2015, para 1.455. Do total, 68% das mulheres assassinadas nesse período eram negras.
RAÇA E CLASSE
O estudo ainda aponta que, enquanto os casos envolvendo mulheres brancas apresentaram leve declínio, o feminicídio aumentou entre mulheres pretas e pardas. Os dados mostram que as políticas para contenção da violência contra mulheres precisam levar em conta raça e classe, como afirma a especialista em gênero Jackeline Ferreira Romio, da Fundação Friedrich Ebert, responsável pela pesquisa.
“Existem populações muito vulnerabilizadas, que sofrem violências múltiplas, e isso impacta eventos extremos como a mortalidade por feminicídio. Para que a política chegue às mulheres negras, ela precisa ser interseccional, considerar a relação entre racismo e violência de gênero. Se não houvesse racismo institucional, não veríamos essa concentração de 68%”, explica.
NÚMEROS SUBESTIMADOS
A especialista revela ainda que os números da segurança pública são subestimados, já que nem todas as mortes violentas de mulheres são investigadas. Dados da saúde apontam que entre 3.500 e 4 mil mulheres morrem por causas violentas por ano no Brasil, das quais cerca de 2.500 são vítimas de feminicídio.
Para a assistente social Roseli Oliveira de Barbosa, da Tamo Juntas, organização feminista que atende mulheres em situação de violência fundada em Salvador (BA), o cenário é bastante desafiador para as mulheres, que assistem o número de feminicídios aumentar a cada dia.
“As mulheres vivem divididas entre a tensão de receber, a qualquer momento, a notícia de que mais uma mulher foi morta, e o medo de ser a próxima. Nós, mulheres negras, além de sermos as principais vítimas, também não conseguimos ter acesso à informação qualificada ou à justiça para nos proteger da violência”, explica.
BAHIA
Em 2025, a Bahia subiu no ranking dos estados que mais registraram mortes de mulheres por feminicídio. Com 57 casos computados de janeiro a julho deste ano, o estado ultrapassou o Rio Grande do Sul e ficou atrás apenas de São Paulo (129) e Minas Gerais (71), segundo dados do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp).
Apesar de ter reduzido pela metade a quantidade de mortes de mulheres em relação ao ano passado – em 2024, nesse mesmo período, já tinham sido registradas 111 ocorrências –, a Bahia não apenas teve aumento em proporção de mortes por estado, como também superou a taxa nacional ao contabilizar 0,66 mortes a cada 100 mil habitantes. O Brasil, atualmente, tem taxa de 0,65 mortes a cada 100 mil habitantes.
Para Roseli, o cenário não surpreende, e é resultado direto da ineficiência do Estado em fornecer e garantir a estrutura de segurança e acolhimento necessário para mulheres vítimas de violência. “Isso é um dado muito significativo para nós. Quando o Estado não consegue defender as mulheres, significa que as políticas públicas não estão sendo implementadas como deveriam.”
COMO SE PROTEGER
A Central de Atendimento à Mulher funciona através do número 180. A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. Através da ligação é possível receber:
Orientação sobre leis, direitos das mulheres e serviços da rede de atendimento (Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referências, Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam), Defensorias Públicas, Núcleos Integrados de Atendimento às Mulheres, entre outros;
Informações sobre a localidade dos serviços especializados da rede de atendimento;
Registro e encaminhamento de denúncias aos órgãos competentes;
Registro de reclamações e elogios sobre os atendimentos prestados pelos serviços da rede de atendimento.
Também é possível entrar em contato através do Whatsapp, pelo número (61) 9610-0180. Em casos de emergência, a delegacia aconselha que Polícia Militar deve ser acionada, por meio do 190.
A Tamo Juntas também dispõe de alguns canais de comunicação, como o instagram, o email e o número de whatsapp, onde a associação atende mulheres de todo o país.




