Episódio tinha como objetivo criar a comoção nacional que garantiu a vitória do então candidato
Por Fernando Benedito Jr.
(DA REDAÇÃO) – O documentário “Bolsonaro e Adélio – Uma fakeada no coração do Brasil”, de Joaquim de Carvalho e Max Alvim, produzido pela TV 247, é uma rara obra de jornalismo investigativo num País que normalizou as fake news e as versões oficiais sem nenhum esforço para buscar novas informações além daquelas amplamente divulgadas pela imprensa “tradicional”.
ATENTADOS E COMOÇÃO
Ao longo da obra, o jornalista Joaquim de Carvalho busca mostrar como o episódio da facada foi um auto atentado com o objetivo de provocar a comoção nacional que acabou por eleger Jair Bolsonaro e mudar os rumos da política nacional. No decorrer da história do Brasil diversos atentados causaram comoção com evidentes desenlaces na política brasileira como aquele contra Getúlio Vargas na rua Toneleros, no Rio de Janeiro; o acidente que matou Juscelino Kubitscheck; o acidente de helicóptero que tirou a vida de Teori Zavascki, ministro do Supremo Tribunal Federal e a morte de Tancredo Neves. Como no caso de Bolsonaro, nenhum deles foi investigado à exaustão e, à exceção de Tancredo, que foi mais um episódio médico do que propriamente político, ainda suscitam dúvidas, teorias de conspiração e dão margem a muitas interpretações.
LUZ NAS TREVAS
Aparentemente, a obra de jornalismo investigativo de Joaquim de Carvalho é apenas uma “versão esquerdista” do episódio ocorrido em 6 de setembro de 2018, na rua Halfeld, em Juiz de Fora, mas na verdade lança luz sob uma série de pontos obscuros neste fato que também provocou comoção nacional e acabou resultando na eleição do então candidato Jair Bolsonaro, que até aquele ponto da campanha havia se recusado a participar dos debates políticos.
QUSTIONAMENTOS
O documentário mostra, por exemplo, que Carlos Bolsonaro, um dos mais ardilosos filhos do presidente e responsável por uma vasta rede de fake news e teorias de conspiração contra a esquerda, mudou subitamente seu comportamento neste episódio da campanha. Sem nunca ter aparecido em nenhum comício do pai, resolve comparecer a Juiz de Fora, onde comanda o esquema de segurança. Carlos Bolsonaro é mostrado num clube de tiro em Florianópolis, também freqüentando por Adélio Bispo de Oliveira, o autor da suposta facada. Em Juiz de Fora, Adélio tenta se aproximar de Carlos Bolsonaro, que se afasta e entra no carro de campanha. Jair Bolsonaro se recusa a usar colete a prova de balas em Juiz de Fora. Testemunhos prevêem a possibilidade de algo acontecer durante a visita a Minas. O esquema de segurança da Polícia Federal ao candidato é absolutamente falho e ao final da campanha, a maioria dos integrantes da escolta são “premiados” com postos-chave no governo ou no exterior. Adélio é protegido da multidão que queria linchá-lo, levado para um presídio de segurança máxima e colocado em absoluto isolamento, embora seu diagnóstico médico sugira que devesse ser internado num hospital psiquiátrico. A cena do suposto crime é totalmente contaminada. Um dos seguranças de Bolsonaro pisa na faca usada por Adélio, pega-a no chão e entrega-a a um vendedor de frutas. Só depois a arma do crime é resgatada pela PM.
O documentário mostra ainda que Jair Bolsonaro já tinha problemas de saúde que requeriam uma cirurgia no intestino. Sua transferência do hospital de Juiz de Fora para o Albert Einstein em São Paulo, depois de campanha nas redes sociais contra o “hospital comunista” Sírio-Libanês, é providencial. No Einstein, tinha médicos de sua confiança.
O documentário levanta estes e uma série de outros questionamentos. Refaz os percursos de Adélio, entrevista ou tenta entrevistar os envolvidos e liga os pontos entre os articuladores da candidatura de Bolsonaro no Brasil e no exterior, como o “guru” direitista Steve Banon, com quem outro filho de Bolsonaro, o atual deputado Eduardo Bolsonaro se encontrara dias antes nos EUA. Banon defende teorias que podem facilitar a ascensão dos líderes direitistas, que vão dos ataques aos pilares da democracia a episódios fatídicos que possam alavancar sua popularidade e eventual vitória.
Teoria esquerdista de conspiração ou não, “Bolsonaro e Adélio – Uma fakeada no coração do Brasil” é um documentário que merece ser visto. Se não responde a muitas perguntas, pelo menos retoma uma discussão necessária e cobra das autoridades uma investigação mais rigorosa sobre o caso.
Além disso, depois dos processos de Sérgio Moro e da força-tarefa de Curitiba contra Lula e do golpe contra Dilma Rousseff, não há motivos para descartar todo tipo de conspirações com o objetivo de assegurar a vitória da direita conservadora no Brasil.