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Após 60 anos de sacerdócio, morre padre Abdala Jorge

“Caiu o muro de Berlim. A União Soviética se esfacelou. E o capitalismo sempre selvagem mantém neste mundo globalizado sua unidade de força que faz a classe trabalhadora calar, como questão de sobrevivência. O desemprego é mais uma arma do capital”
Padre Abdala

 

TIMÓTEO – A comunidade timotense perdeu na noite de segunda-feira (30) um dos personagens mais ilustres de sua história: o padre Abdala Jorge. O pároco faleceu aos 85 anos, dos quais 60 foram dedicados ao sacerdócio e à comunidade da paróquia São José.
Natural de São João Del Rey, padre Abdala chegou a Timóteo para auxiliar Monsenhor Rafael e desde então se incorporou profundamente à vida da cidade, tornando-se uma autoridade respeitada por toda a população. Em 1958, ele foi nomeado pároco antes mesmo da criação jurídica da paróquia.
Com a saúde debilitada em função de um atropelamento ocorrido em junho de 2008, padre Abdala foi hospitalizado na última quinta-feira (26), com um avançado quadro de pneunomia. Apesar do tratamento, ele não resistiu e faleceu às 23h45 de anteontem.
O velório foi realizado na igreja matriz São José Operário, local em que por mais de seis décadas o padre realizou missas, casamentos e batismos, antes de se aposentar por problemas de saúde.
Na parte da manhã, a movimentação de fiéis na capela já era intensa, tanto que a Polícia Militar interditou um lado da Alameda 31 de Outubro para a segurança de quem se dirigia ao velório.
As homenagens da comunidade foram feitas às 15h, antes da missa de corpo presente. O bispo emérito da Diocese de Itabira, Dom Odilon Guimarães, veio especialmente para presidir a celebração em homenagem a Padre Abdala.
O cortejo fúnebre percorreu o contorno da Praça 1° de Maio, em seguida desceu pela Alameda 31 de Outubro, avenida JK, no bairro Funcionários, passando pela Feira Livre do Timirim. Depois, contornou próximo ao Centro Educacional Católico (CEC) e seguiu pela avenida Antonieta Martins de Carvalho, passando em frente à Igreja do bairro Timirim, Hospital Vital Brazil e para o bairro Olaria até o Cemitério Jardim da Saudade.

SACERDÓCIO
Irmã Aparecida, 73 anos, veio para a paróquia São José no mesmo ano em que Padre Abdala. Ela contou que o pároco foi ordenado em Mariana, no ano de 1953, e logo foi designado para sua primeira e única igreja, a São José.
“Ele era um pai, irmão, amigo e companheiro. Em novembro do ano passado, ele completou 60 anos de serviço à igreja. Foram muitos trabalhos que ele criou, como o Grupo das Lavadeiras e o de Jovens. Ele era um padre que gostava de estar entre a juventude”, contou.
Uma das poucas diversões do pároco era a leitura. Aparecida contou que padre Abdala constantemente levava um livro debaixo do braço. Entre os hábitos diários, estava ainda a leitura dos jornais regionais e, às 20h, sempre que podia, o padre assistia ao Jornal Nacional.
“Depois que se aposentou, a leitura passou a ser um hábito mais forte. Todos os dias ele lia passagens da Bíblia e falava horas a fio sobre os evangelhos e histórias de seus sermões. Há seis meses, quando sua visão começou falhar, foi que passamos a ler para ele. Tínhamos que comprar os jornais e ler para ele, porque o padre Abdala queria saber o que acontecia aqui e no mundo”, recordou.

ACIDENTE
Após cumprir com sua rotina matinal na Casa Paroquial, situada na rua Morada do Rio, Centro Sul de Timóteo, padre Abdala foi atropelado quando atravessava a Alameda 31 de Outubro. Isso aconteceu em junho de 2008.
O pároco foi atropelado por um motociclista. Com o impacto, ele foi arremessado para o chão e acabou batendo a cabeça no asfalto. Na colisão, o padre quebrou nariz, uma das pernas e um braço.
Em função do vários exames feitos após o acidente, descobriu-se que padre Abdala era portador do Alzheimer. Mesmo com o diagnóstico médico, as pessoas que conviviam de perto com o padre diziam que ele tinha a mente muito lúcida, o que levou muitos a desconfiarem da avaliação neurológica.
“Depois que o padre bateu cabeça, ficou muito debilitado. Mas ainda assim ele tinha muita credibilidade em meio ao empresariado. Todos os presidentes da Acesita antes de assumir vinham pedir conselhos e a benção dele. O mesmo aconteceu com os prefeitos que passaram por Timóteo. O padre Abdala esteve presente em todos os momentos importantes da história do município. Não se conta a trajetória de Timóteo sem mencioná-lo”, declarou irmã Aparecida.

INFLUÊNCIA
Atualmente, à frente da paróquia São José está o padre Passifal José do Nascimento. Ele foi designado para substituir o padre Moacir em 2010, que assumiu a igreja quando padre Abdala se aposentou.
Padre Passifal lembrou que, quando chegou a Timóteo, tinha outra visão da igreja, pois vinha de uma cultura diferente. Com a convivência junto ao padre Abdala, ele conheceu o convívio com o povo simples e humilde.
“Apesar de ter se aposentado, o padre Abdala fazia questão de atender aos noivos que vinham à casa paroquial. Entregava também as certidões de batismo. A convivência com ele foi um presente. Só há um ano que ele se sentiu mais fragilizado e por conta dos problemas se afastou. Mas fez isso chateado”, falou.

FILHOS DO CORAÇÃO
O trabalho em prol da comunidade de Timóteo são os frutos vivos que padre Abdala vai deixar de seus 60 anos de sacerdócio. O ex-morador de rua Edinei Ferreira Castro é um dos muitos filhos do coração que o pároco ganhou ao longo de sua careira.
“Morava atrás da igreja em um barraco. Essa casa foi o padre quem nos ajudou a comprar. Foi mais do que um pai, porque meu pai biológico só prestou para fazer os filhos e abandonar a família. Ele dava comida e roupa. Comprou uma carroça e uma égua para que pudesse trabalhar”, contou.


Padre Passifal assumiu a paróquia São José em 2010,
mas sempre contava com o apoio de Padre Abdala
  (Crédito: Nadieli Sathler)


Irmã Aparecida foi designada para trabalhar em
Timóteo junto com Padre Abdala, em 1953,
para ajudar Monsenhor Rafael

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