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Retroatividade da Lei da Ficha limpa pode atingir políticos da região

Audiência no plenário do STF debate os prazos de inelegibilidade da Lei da Ficha Limpa (Foto: Carlos Moura/STF)

DA REDAÇÃO – O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou para a próxima semana a definição sobre o prazo de inelegibilidade anterior à Lei da Ficha Limpa. Até agora, a votação dos magistrados registra o placar de três contrários e cinco votos favoráveis à retroatividade da norma, e aponta o entendimento de que a legislação impede a participação, em pleitos eleitorais, de políticos condenados por abuso de poder ou improbidade administrativa. Faltam mais três votos a serem proferidos no plenário do Tribunal, em reunião agendada para quarta-feira (4).
Em Ipatinga e Timóteo, por exemplo, os prefeitos Sebastião Quintão e Geraldo Hilário, que têm as suas candidaturas questionadas nos termos da Lei da Ficha Limpa, assumiram as respectivas prefeituras sob efeito de liminares judiciais. O mesmo quadro de instabilidade ocorre em centenas de outras cidades, na região, em Minas Gerais e no país, que hoje dependem do posicionamento do STF.
A decisão terá repercussão direta nas condições eleitorais de centenas de políticos que respondem ou já foram condenados em processos por abuso de poder, possibilitando até a cassação de deputados, vereadores e prefeitos no exercício de seus cargos atuais.

CONTINUIDADE
Na quinta-feira (28), o STF deu continuidade ao julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 929670, que discorda da possibilidade de aplicação do prazo de oito anos de inelegibilidade, introduzido pela Lei Complementar nº 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), às condenações anteriores por abuso de poder, com trânsito em julgado, nas quais o prazo de três anos previsto na redação anterior da Lei Complementar (LC) nº 64/1990 já tenha sido cumprido.
No plenário do STF, até o momento, cinco ministros votaram pelo desprovimento do recurso – Luiz Fux, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Dias Toffoli – e três ministros se manifestaram pelo provimento do RE – o relator Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes.
O autor do recurso é um vereador de Nova Soure (BA) que foi condenado por abuso de poder econômico e compra de votos por fatos ocorridos em 2004, e ficou inelegível por três anos. Nas eleições de 2008, concorreu e foi eleito para mais um mandato na Câmara de Vereadores. Mas, no pleito de 2012, seu registro foi indeferido porque a Lei da Ficha Limpa (que passou a vigorar efetivamente naquele pleito) aumentou de três para oito anos o prazo de inelegibilidade previsto no artigo 1º, inciso I, alínea d, da LC 64/1990.

DIVERGÊNCIA
O julgamento foi retomado com a apresentação do ministro Luiz Fux, que votou no sentido de negar provimento ao recurso e abriu divergência em relação ao relator da matéria, ministro Lewandowisk. Segundo ele, o regime jurídico das condições de elegibilidade e das hipóteses de inelegibilidade “se ancora em critérios políticos e legislativos que possuem racionalidade e fundamentos diversos da natureza de sanções”. “Essa multiplicidade de fundamentos que autorizam o legislador complementar a introduzir novas causas limitadoras da cidadania passiva revela que não é sanção essa inelegibilidade”, sustentou.
Em seu voto, o ministro destacou que a decisão que reconhece a inelegibilidade somente produzirá efeitos nas esferas jurídica e eleitoral do condenado se ele vier a formalizar registro de candidatura em eleições futuras. “Assim, para se operar o efeito da inelegibilidade deve haver o registro de candidatura, uma vez que a declaração de inelegibilidade (artigo 22, inciso XIV) não produz efeitos jurídicos eleitorais imediatos na esfera jurídica do condenado, ao contrário da pena de cassação do diploma”, observou.

LÓGICA

De acordo com o ministro Luiz Fux, o indivíduo que tem a intenção de concorrer a cargo eletivo deve aderir ao estatuto jurídico eleitoral. “É essa característica continuativa do enquadramento do cidadão na legislação que também permite concluir pela validade da extensão dos prazos de inelegibilidade nas ações de controle concentrado da Lei da Ficha Limpa no Supremo”, completou.
O ministro ressaltou que os prazos poderão ser estendidos se ainda estiverem em curso, ou até mesmo restaurados para que cheguem a oito anos em razão de lei nova, desde que não ultrapasse esse prazo. “Trata-se tão somente de imposição de um novo requisito negativo para que o cidadão possa candidatar-se a cargo eletivo e não se confunde com agravamento de pena ou bis in idem”, disse, ao afirmar que o legislador distingue claramente a inelegibilidade das condenações.

VOTOS

O ministro Alexandre de Moraes seguiu o relator ao dar provimento ao recurso. Para ele, não há dúvidas quanto ao avanço trazido pela LC 135/2010, porém considerou que o caso dos autos “não afeta as conquistas da Lei da Ficha Limpa”, mas desrespeita o princípio da segurança jurídica, da boa-fé e a coisa julgada.
O ministro Edson Fachin acompanhou a divergência, ao considerar que não há direito adquirido a um regime de elegibilidade. Segundo ele, o aumento de três para oito anos “não afasta requisito negativo de adequação de quem se coloca a pleito eleitoral para preencher as respectivas condições”. “Trata-se de um fato do passado que se projeta para o presente, e essa circunstância se afere no momento do pedido de registro de candidatura”, completou.

VIDA PREGRESSA
Para o ministro Roberto Barroso, a própria Constituição Federal autorizou a inelegibilidade com base na vida pregressa dos candidatos. Ele considerou inequívoco o pronunciamento do Supremo sobre a matéria, no sentido de que a presente causa de inelegibilidade pode ser aplicada a fatos anteriores a sua introdução no ordenamento eleitoral, porque não tem natureza jurídica de sanção “Seu propósito é assegurar o bom funcionamento do pleito eleitoral e a produção de resultados sadios para a democracia”, pronunciou.
Também acompanhou a divergência a ministra Rosa Weber, pelo desprovimento do recurso. Ela avaliou que a ideia da inelegibilidade em questão não é punir um indivíduo, mas o foco é a coletividade, “buscando-se preservar a legitimidade das eleições, a autenticidade da soberania popular e, em última análise, assegurar o processo de concretização do Estado Democrático de Direito”.

PROTEÇÃO

O ministro Dias Toffoli votou no sentido de negar provimento ao RE e lembrou que o tema já foi tratado pelo STF anteriormente. “Os princípios inseridos na Constituição Federal, que norteiam a redação da lei complementar de inelegibilidade, são a proteção de uma série de bens jurídicos tão valorados pela Constituição, que ela determina que o eventual potencial de afronta a aqueles bens deve levar a uma inelegibilidade”, concluiu.

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