Cidades

O policial bolsonarista

Cena ilustrativa de abordagem policial em São Paulo (Foto: arquivo)

(*) Fernando Benedito Jr.

“Pode preparar que agora não foi PT que ganhou, não. Quem ganhou foi Bolsonaro. Agora não vai ter pano para ladrão, mais não”. A declaração, em tom autoritário e avisando que a partir de agora não vai ter moleza, vem de um policial militar lotado no 14º Batalhão da Polícia Militar, em Ipatinga, após “enquadrar” um suposto “bando de ladrões”, no bairro Cidade Nobre. Eram estudantes, alguns com as melhores performances (e ainda que não tivessem) numa das melhores escolas de Ipatinga (o que não exclui as públicas). Evidentemente, não estavam uniformizados, mas com corte de cabelos “suspeitos”, alguns usando piercing, bermudas caídas no meio da bunda, a tez um pouco mais escura, todos menores, com seus skates, e outras características que os colocam no preconceituoso, racista e nem sempre preciso rol de “suspeitos”.

Sem querer contemporizar, é certo que os PMs não têm bola de cristal para saberem quem é ou não bandido, mas precisam ter um pouco mais de treinamento sobre as abordagens, sob risco de se tornarem antipatizados pela comunidade, como já está acontecendo entre grande parte da juventude. Uma coisa é abordarem adolescentes, estudantes, skatistas, com gírias estranhas e desarmados; outra, enfrentarem bandidos e traficantes com arsenais e disposição de fogo. Se não querem saber de direitos humanos, pelo menos deveriam procurar entender um pouco mais da Constituição que são obrigados a defender para garantir o direito de ir e vir, o respeito à diversidade, inclusive de pensamento, porque se são direitistas, precisam, por questão de civilidade, aprenderem a conviver com esquerdistas. Ou vão se tornar milicianos foras da lei, exterminadores que eliminam todos que não pensam iguais a eles, e se tornam piores do que aqueles que deveriam combater? Ora, pois…

Retorna à memória, por óbvio, aquela velha imagem de policiais militares, nos tempos da ditadura militar (que alguns juram nunca ter existido), chegando aos bares, em “batidas” sinistras, intimando todo mundo a colocar as mãos na parede, de pernas abertas, sob a voz de comando:

– Documento, documento! Carteira de trabalho, todo mundo! – naquela época, carteira de trabalho era o documento padrão. E as “batidas”, juntamente com prisões ilegais e torturas eram políticas de estado.

Hoje, após a reforma trabalhista, em grande parte patrocinada pelas forças de direita que estão no poder, praticamente suprimiu-se a Carteira de Trabalho, além do quê, não tem emprego. Então é preciso rever conceitos, mesmo sob o inteligentíssimo governo que tão bem representa os militares.

É preciso entender, senhores policiais, que o fato de se sentirem representados pelo governo Bolsonaro, não significa que milhões de brasileiros compartilhem da mesma afinidade, como se viu pelo resultado das urnas. E, por fim e ao cabo, não quero que meu filho seja vítima de abordagens autoritárias, fascistas, feitas por PMs preconceituosos, discricionários e racistas. Quero que a PM, direitista ou esquerdista, embora pense que devesse ser apartidária, seja inteligente, simpática, educada, respeitosa, que garanta a paz e a segurança dos cidadãos, de preferência, assegurando os direitos humanos e todos os demais direitos constitucionais que a Lei lhes faculta. É preciso diferenciar a simpatia política por tal ou qual governo das políticas de Estado que as forças de segurança tem o dever de preservar.

Era o que tinha dizer, por ora.

(*) Fernando Benedito Jr. é editor do Diário Popular e pai.

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