Cidades

O burlesco e o trágico na canalhice golpista

(*) Fernando Benedito Jr.

A farsa burlesca da cassação da presidenta eleita Dilma Rousseff já foi mais do que exposta. Trata-se de uma decisão política que reúne o amplo espectro da direita nacional, que vai dos moderados aos fascistas mais radicais, a quem se alia a mídia monopolista, capitaneada pela Rede Globo e Abril, setores do Judiciário e a oligarquia corrupta do Congresso Nacional.
Não há nada de técnico, nada de Direito, nada de constitucional, crime de responsabilidade, enfim, nenhuma motivação senão a decisão política de encerrar um ciclo da política nacional dominada pela esquerda nas urnas. Sem chance de derrotá-la aí, nas urnas, aproveitou-se a conjuntura fértil (crise econômica, crise política, ingovernabilidade) para desfechar o golpe.
A decisão de depor Dilma já foi tomada num tribunal de exceção, onde o direito à defesa é apenas um rito formal para demonstrar aos espectadores que o conteúdo é outro, que a ré pode se defender, teve acesso ao contraditório, que o Estado Democrático de Direito está preservado, etc. Ninguém foi sensibilizado pela auto-defesa de Dilma, ninguém vai mudar seu voto e pronto. Criou-se a jurisprudência para depor todos que governarem mal, todos que prometerem e não cumprirem, todos que forem apanhados de calça na mão por uma crise econômica que não lhes permita cumprir o combinado – então, é bom que a borboleta não bata as asas na Ásia e cause um tsunami por aqui. E mais, a partir da cassação de Dilma, todos os prefeitos e governadores que cometerem desatinos orçamentários como as tais “pedaladas fiscais” estarão automaticamente na mira dos opositores para serem removidos de seus cargos, onde foram colocados pelo voto e de onde podem sair por decisão das Câmaras de Vereadores e Assembléias Legislativas. Em tese, é isso, se é que a lei é igual para todos.
Na verdade, criou-se um regime estranho à Constituição. Embora o País tenha passado por um plebiscito, que decidiu pelo presidencialismo como regime de governo, os golpistas de 2016 resolveram alterar a Constituição e instituir uma República parlamentarista corrupto-ditatorial, sem primeiro-ministro, sem voto de censura. Nesta República, se as coisas derem errado, cassa-se o Executivo. Simples assim.
A menos, é claro, que os parlamentares tenham cargos, verbas, propinas, regalias, reajustes, duodécimos, nepotismo. Esses regalos que tanto agradam aos deputados e senadores da República bananeira do Brasil.
Depois de ouvir Janaína Pascoal arvorando-se de defensora do Brasil, uma verdadeira Joana D’arc, uma Anita Garibaldi a soldo de 45 patacas; de ter que tolerar Aécio Neves dizendo que 54 milhões de votos não são salvo conduto para ninguém, definitivamente, não resta muito a fazer, senão resgatar a bandeira e voltar às ruas para defender as diretas-já. Lembram-se? Foi um movimento que o avô de Aécio Neves, o senhor Tancredo Neves foi às ruas defender até que recebeu uma proposta irrecusável e saiu das ruas para se eleger presidente através do voto indireto no Congresso Nacional. Traiu o movimento e morreu antes de tomar posse, mas deu alguma contribuição para a construção da democracia que seu neto agora luta para destruir. A vida é assim…
A esquerda brasileira continuou lutando. Vai continuar lutando, porque é assim que se constrói um País. É assim que se constrói a democracia. Aos solavancos e com muita luta porque as oligarquias não suportam ver filho de pobre estudando no Ciência sem Fronteiras, com o Prouni, as linha da pobreza diminuindo, o Bolsa-família dando um mínimo de dignidade a quem não tem o que comer, os aeroportos cheios de operários viajando, os “comunistas cubanos” do Mais Médicos ajudando a solucionar o problemas da saúde pública no País, o Pronatec formando mão de obra qualificada. Isso provoca desequilíbrio fiscal.
E provoca também desequilíbrio mental. O que se viu de sandices ao longo deste processo golpista, desde o seu início com as manifestações anti-PT, anti-Lula e anti-Dilma, até a chantagem inicial de Cunha, passando pela ridícula votação da Câmara dos Deputados e, finalmente, com a farsa burlesca do tribunal de exceção do Senado, é um estado de catatonia coletiva que a psicanálise precisa estudar melhor no futuro.
O que não precisará ser muito estudado é o destino de todos aqueles que de uma forma ou de outra contribuíram para esta vergonhosa ruptura democrática no Brasil. Este destino é certo: já tem e lugar reservado na lata de lixo da história.

(*) Fernando Benedito Jr. defende a democracia, lutou pelas diretas-já, é contra o golpe e, eventualmente, editor do Diário Popular.

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