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Ipatinga é alvo de Janot por lei que proíbe discussão de gênero em escolas

(DA REDAÇÃO) — O município de Ipatinga está entre as sete cidades alvo de uma ofensiva da Procuradoria-Geral da República (PGR), contra leis municipais que proíbem o ensino de "ideologia de gênero" nas escolas mantidas pelas prefeituras. Em Ipatinga, o plenário da Câmara Municipal de Ipatinga provou em 26 de agosto de 2015 o Plano Municipal de Educação. O PME visa responder as necessidades educacionais do município nos próximos 10 anos.
Com apenas um voto contrário, da vereadora Lene Teixeira (PT), também foram aprovadas as duas emendas ao Plano Municipal de Educação que impediam o Poder Executivo de adotar qualquer ação ou diretriz de promoção à diversidade de gênero nas escolas de Ipatinga, incluindo as municipais, estaduais e particulares. As emendas foram aprovadas em bloco, juntamente com outras cinco. O plano incluia temas como número de alunos por sala e remuneração de professores, mas a questão do gênero acabou dominando a discussão. A “ideologia de gênero” faz referências à identidade de gênero, diversidade e orientação sexual, e seu principal articulador foi o então vereador Nilson Lucas – Nilsinho (PMDB), secundado pelo também ex-vereador Nilsin da Transil, que defendeu a família tradicional e culpou o governo federal por passar a decisão desse tema aos municípios. O ignorante debate que à época tomou conta do plenário apelou para a defesa da família tradicional, como se a aprovação de um Plano Municipal de Educação fosse definir a opção sexual das pessoas. Caracterizado pelo fundamentalismo religioso e pelo radicalismo, o tema que já está definido em legislação federal acabou sendo aprovado pela maioria da Câmara, o que resultou demonstrado, mais uma vez, o equívoco do debate.

VEDAÇÃO
No texto original encaminhado à Câmara de Ipatinga, o Artigo 3º do PL 66/2015, estabelecia que “caberá ao Poder Executivo Municipal a adoção das medidas governamentais necessárias à implementação das estratégias para o alcance das metas previstas no PME”.
A primeira emenda elaborada pelo vereador Nilsinho, e que contou com a adesão de outros parlamentares, acresceu ao texto um impedimento de se adotar, “nem mesmo sob forma de diretrizes, nenhuma estratégia ou ações educativas de promoção à diversidade de gênero”. A emenda também tinha como objetivo evitar que fosse implementado ou desenvolvido qualquer ensino referente à ideologia de gênero e orientação sexual. Diz a proposta: “…Sendo vedada a inserção de qualquer temática da diversidade de gênero nas práticas pedagógicas e no cotidiano das escolas”.

FAMÍLIA
A outra emenda modificativa ao PL 66/2015, articulada pelo vereador Nilson Lucas, alterou a redação do início do artigo 2º da proposição, no qual eram elencadas as diretrizes básicas da educação em Ipatinga. O texto original afirmava que o Poder Executivo Municipal adotaria as diretrizes específicas do PME e as definidas no art. 214 da Constituição Federal e no art. 2º da Lei Federal nº 13.005. A alteração proposta afirma que todas estas diretrizes poderiam ser implementadas, “excetuando o que se referir à diversidade de gênero”.
Para o então vereador Nilson Lucas questões relativas à sexualidade das crianças deveriam ser tratadas no âmbito da família e não na escola.

ANTI-CONSTITUCIONAL

Até agora, já foram apresentadas sete ações contra as cidades do Novo Gama (GO), Cascavel (PR), Paranaguá (PR), Blumenau (SC), Palmas (TO), Tubarão (SC) e Ipatinga (MG). O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entende que tais leis têm fundo religioso e estimulam o sofrimento, violência, marginalização e evasão escolar de homossexuais.
Segundo Janot, as sete leis violam os dispositivos constitucionais relativos ao direito à igualdade, à proibição de censura em atividades culturais, ao devido processo legal, à laicidade do Estado, à exclusividade da União de legislar sobre diretrizes e bases da educação, ao pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e ao direito à liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber.
Com exceção da primeira ação, protocolada em 23 de maio contra o município do Novo Gama, localizado no Entorno de Brasília, em todas as outras Janot também diz que as leis contrariam o objetivo constitucional de “construir uma sociedade livre, justa e solidária”. O procurador-geral da República diz ainda que as leis impõem "concepção moral de marcado fundo religioso".

OBSCURANTISMO
Segundo ele, cada uma das sete leis "é obscurantista, porque almeja proscrever o próprio debate sobre uma realidade humana". Além disso, veda ou pretende vedar "qualquer abordagem de temas ligados à sexualidade que não seja para reafirmar uma inexistente equivalência entre sexo e gênero e para ignorar quaisquer realidades distintas da orientação sexual heteroafetiva".
Mais adiante, acrescenta que o "não reconhecimento social da diversidade sexual acirra condutas discriminatórias que se repetem também no espaço da escola", transformando-o em local "de sofrimento e violência para a população LGBT, provocando evasão escolar, marginalização e outras formas de violência".

DISTRIBUIÇÃO

No caso da ação contra a lei do Novo Gama, o relator, ministro Alexandre de Moraes, já tomou inclusive decisão negando seu prosseguimento. Ele sequer analisou o mérito do pedido, porque entendeu que o Ministério Público deveria ter questionado a lei municipal primeiramente no Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), o que não chegou a ocorrer. As outras seis ações, protocoladas na semana passada, estão com outros relatores, que ainda não tomaram nenhuma decisão. São eles: Luiz Fux (Cascavel), Luís Roberto Barroso (Paranaguá e Palmas), Edson Fachin (Blumenau), Rosa Weber (Tubarão) e Gilmar Mendes (Ipatinga).
"Oficie-se ao Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás para que, ciente do teor da presente arguição, tome as medidas que entender cabíveis em face do ato impugnado perante o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás", escreveu Moraes em decisão tomada em 30 de maio deste ano.

REPERCUSSÃO GERAL

Embora o ministro tenha dito que o caso envolvendo o Novo Gama devesse ser julgado no TJGO, Janot argumentou que a ação deveria ser apresentada diretamente ao STF. Ele lembrou que há vários municípios pelo Brasil com leis parecidas. Assim, uma decisão da mais alta corte no Brasil evitaria entendimentos divergentes entre os vários Tribunais de Justiça (TJs) estaduais.
"A controvérsia quanto à constitucionalidade da proibição de educação para a diversidade sexual tem potencial para gerar graves problemas no sistema jurídico, uma vez que decisões conflitantes podem ser tomadas no controle de constitucionalidade de leis municipais e estaduais pelos estados-membros", argumentou Janot na ação contra a lei do Novo Gama.
No caso do município goiano, não é a primeira vez que Janot protocolou uma ação contra uma lei que ele entende ter fundo religioso. Em novembro do ano passado, o procurador-geral questionou uma lei que proibia protestos contra o cristianismo na cidade e determinava inclusive pena de até um ano e quatro meses para os manifestantes. Janot argumentou que a norma hierarquizava as religiões, violando o princípio da laicidade, além de ferir liberdade de expressão e legislar sobre matéria penal, o que poderia ser feito só pelo Congresso Nacional. Em dezembro, o ministro Dias Toffoli concordou e aceitou o pedido, suspendendo a lei.

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