Cidades

Em favelas do Rio, até o crime organizado combate coronavírus

Por Ricardo Moraes e Debora Moreira e Rodrigo Viga Gaier

RIO DE JANEIRO (Reuters) – Os bailes funk foram proibidos e o comércio tem que fechar as portas mais cedo. Na luta contra o coronavírus, o tráfico e as milícias impuseram toques de recolher nas favelas do Rio de Janeiro, onde há uma grande preocupação com a disseminação da doença diante da falta de condições adequadas de higiene e da dificuldade de se manter em isolamento.

Na Cidade de Deus, comunidade da zona oeste do Rio onde moram quase 40 mil pessoas, foi registrado no fim de semana o primeiro caso de Covid-19 em uma favela da cidade. Outros 60 casos são considerados suspeitos em comunidades do Rio, que têm população de quase 2 milhões de pessoas.

Moradores de diferentes comunidades relataram, sob condição de anonimato devido à sua segurança, que tanto o tráfico de drogas quanto milícias impuseram medidas restritivas para diminuir a circulação de pessoas de forma a combater a disseminação do vírus.

À medida que o coronavírus avança pelo Brasil, com 46 mortes e 2.201 casos confirmados no país até terça-feira, a preocupação nas favelas é agravada devido à falta de saneamento básico e abastecimento de água, além do grande número de pessoas morando em casas pequenas, muitas vezes com um cômodo e sem circulação de ar.

“Às vezes, nem água a gente tem para lavar a mão corretamente”, disse à Reuters Jefferson Maia, de 27 anos, morador da Cidade de Deus. “Ter casos próximos acaba sendo preocupante, porque a Cidade de Deus é grande, mas, ao mesmo tempo, é pequena. Se todo mundo se esbarra e todo mundo tem contato, as pessoas acabam ficam preocupadas”.

FALTA DE ÁGUA

Thamiris Deveza, médica da família que trabalha no Complexo do Alemão, disse que moradores reclamam há cerca de 15 dias sobre a falta de água em suas casas, o que dificuldade ainda mais seguir as orientações sanitárias de lavar sempre as mãos e se proteger do vírus altamente contagioso.

“Vivenciei também pessoas levando copo para a unidade de saúde para poder encher de álcool em gel, porque a maioria das farmácias já não tem e, quando tem, o preço é super elevado”, acrescentou.

O Rio de Janeiro é o segundo Estado com mais casos confirmados de coronavírus no Brasil, com 305, atrás apenas de São Paulo (810), segundo dados desta terça. O Estado já confirmou seis mortes em decorrência do Covid-19.

COLAPSO

O governador Wilson Witzel alertou na sexta-feira que o sistema de saúde do Estado pode entrar em colapso em 15 dias.

O prefeito da capital, Marcelo Crivella, anunciou que serão distribuídos galões d´água e barras de sabão nas comunidades, e que idosos com problemas de saúde serão realocados para hotéis. Segundo ele, a prefeitura já possui 400 quartos à disposição.

“Os que correm mais risco precisam ser preservados o quanto mais cedo”, disse Crivella.

A partir desta terça-feira, a companhia de limpeza urbana do Rio, a Comlurb, inicia uma grande faxina na cidade com jatos d´água e detergente para limpar áreas de grande circulação de pessoas, como estações de ônibus, trem, metrô e as proximidades dos hospitais da cidade.

Mas, apesar dos esforços, as comunidades mais pobres ainda representam um enorme desafio para a saúde pública, em meio à pandemia do coronavírus, disse Edimilson Migowski, infectologista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

“A entrada do coronavírus em áreas adensadas, menos planejadas e menos assistidas pode ser algo devastador”, disse ele à Reuters. “Onde falta água, sabão e detergente vai ser difícil de segurar a propagação”, acrescentou.

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